No BM&C News, David Andrade Silva, analisa a liquidação do Banco Master

Publicado em 19.11.2025 no BM&CNews

A liquidação extrajudicial do Banco Master, decretada pelo Banco Central em 18 de novembro, abriu uma nova fase de incertezas para o sistema financeiro brasileiro. A medida, que paralisa completamente as operações da instituição e transfere sua administração para um liquidante indicado pelo BC, levanta questões sobre os critérios que levam à intervenção, a responsabilidade dos antigos gestores, os riscos para os credores e o caminho até a retirada definitiva do banco do Sistema Financeiro Nacional (SFN).

Para esclarecer esse processo, a BM&C News ouviu dois especialistas em direito empresarial, recuperação e falências: Rafael Luzzin, sócio do Benites Bettim Advogados, e Antonio Carlos Verzola, advogado e especialista em Direito Empresarial e Mercado de Capitais, e sócio da BBMOV Advogados, ambos com experiência direta em processos de liquidação de instituições financeiras.

Por que o Banco Central decreta a liquidação extrajudicial

A liquidação extrajudicial é o passo mais drástico previsto na Lei 6.024/1974, acionado somente quando não há mais condições seguras de continuidade das operações de um banco.

Segundo Rafael Luzzin, a medida só é adotada quando ficam comprovados cenários graves, como:

  • Insolvência ou incapacidade de honrar compromissos;

  • Violação relevante das normas do sistema financeiro;

  • Prejuízos acumulados que coloquem os credores em risco anormal;

  • Descumprimento de deveres após perda da autorização de funcionamento.

Antes disso, o BC tenta alternativas menos severas, como exigências prudenciais, ajustes de gestão ou intervenção. “A liquidação é sempre a última etapa. É uma medida de proteção ao público e de preservação da estabilidade do mercado”, explica Luzzin.

Antonio Carlos reforça que o Ato do Presidente do BC nº 1.373, que decretou a liquidação extrajudicial do Master, fundamenta-se justamente nas duas causas mais graves previstas em lei: comprometimento da situação econômico-financeira e violação das normas aplicáveis.

O que acontece imediatamente após a liquidação extrajudicial?

Com a decretação da liquidação:

  • O banco para de operar na hora;

  • Um liquidante nomeado pelo BC assume a gestão;

  • Inicia-se o levantamento detalhado de ativos, passivos, contratos, carteiras e contingências;

  • Todos os ex-administradores, incluindo o controlador, têm seus bens tornados indisponíveis;

  • É montada uma Comissão de Inquérito, que apura as causas da liquidação, eventuais irregularidades e responsabilidades.

Os contratos de trabalho são rescindidos, permanecendo apenas funcionários essenciais ao processo.

Como é feito o pagamento dos credores?

O liquidante elabora um quadro geral de credores, seguindo a ordem legal da Lei de Falências:

  1. Despesas da própria liquidação;

  2. Trabalhistas;

  3. Credores com garantia real;

  4. Fiscais;

  5. Quirografários (sem garantia);

  6. Subordinados.

Os especialistas alertam que é comum haver passivo a descoberto, especialmente em casos nos quais há suspeita de irregularidades ou má gestão, situação semelhante ao que vem sendo noticiado no caso do Banco Master.

Se a massa liquidanda não for suficiente para quitar as dívidas, o BC encaminha o relatório da Comissão de Inquérito ao Ministério Público e ao Judiciário para abertura de Ação Civil Pública de responsabilização, podendo resultar em sanções civis, administrativas e penais aos antigos gestores.

Quando o FGC entra em ação

Com a liquidação extrajudicial, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) passa a atuar na proteção de depositantes até o limite legal de R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, considerando o teto por instituição e conglomerado.

Para que o fundo inicie o pagamento:

  1. O liquidante envia ao FGC a base de dados completa dos credores elegíveis;

  2. O FGC valida as informações;

  3. É disponibilizada a consulta e o início dos ressarcimentos.

Até que isso ocorra, todos os clientes permanecem temporariamente sem acesso aos recursos.

O caminho até a retirada do SFN e a possibilidade de falência

A liquidação se encerra quando:

  • os ativos são realizados,

  • os passivos quitados na medida do possível,

  • o relatório final do liquidante é aprovado pelo BC,

  • e o banco é formalmente excluído do Sistema Financeiro Nacional.

Mas, segundo os especialistas, a etapa final mais comum é outra: a decretação de falência caso a massa liquidanda não cubra os passivos, o que tende a acontecer na maioria das liquidações extrajudiciais. Nesse ponto, o processo passa ao Judiciário e se prolonga por anos.

Há padrões entre o caso Master e liquidações extrajudiciais anteriores?

Para os especialistas, sim e muitos.

Luzzin cita um “ciclo conhecido” em bancos que chegam à liquidação:

  • Governança falha

  • Controles internos frágeis

  • Riscos elevados e mal mensurados

  • Operações pouco transparentes

  • Concessões de crédito questionáveis

  • Registros contábeis inconsistentes

Ele lembra o caso do Banco Neon (2018), liquidado pela combinação desses fatores. “O que se observa agora no caso do Banco Master segue uma lógica semelhante”, afirma.

Antonio reforça: “As causas sempre são as mesmas. As instituições liquidadas invariavelmente apresentam modelos de negócio frágeis e com falhas estruturais de governança”.

Para o sistema, o Master não é só um caso isolado, é um alerta

A liquidação do Master chega em um momento de maior atenção a bancos médios, fundos de pensão e riscos de crédito. Para os especialistas, o caso deve acelerar:

  • Discussões sobre a supervisão do BC;

  • Regras de governança;

  • Critérios de investimento de fundos de previdência;

  • Revisão do papel e dos limites do FGC.

Para o advogado societário David Andrade Silva, sócio da Andrade Silva Advogados, o caso do Banco Master reforça a necessidade de ampliar a vigilância sobre estruturas internas de controle e sobre a atuação dos administradores. Segundo ele, “processos de liquidação extrajudicial sempre revelam que as fragilidades não surgem da noite para o dia; elas se acumulam ao longo dos anos e, quando não enfrentadas, tornam-se riscos sistêmicos”. Para Silva, o episódio serve também como teste institucional: “A resposta coordenada entre Banco Central, FGC e Ministério Público mostra que os mecanismos de proteção existem e funcionam, mas evidencia que falhas de governança continuam sendo o ponto mais sensível das instituições financeiras brasileiras”.

O ponto comum entre os especialistas é claro, a liquidação do Banco Master deve ser vista como um marco regulatório e um alerta pedagógico para todo o sistema

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